Implicações do mundo sob tensão para o Grande Consumo
A incerteza vivida nos dois últimos anos, que se irá manter num futuro ainda indeterminado, traz grandes desafios à economia. No último report Global FMCG Omnichannel de 2022, a Kantar procura analisar a forma como esta incerteza tem impactado e impactará o mercado de grande consumo a nível mundial.
Apesar de este ser um mercado que tende a ser, globalmente, mais resiliente às crises, isso não significa que internamente não sejam vividas profundas mudanças. No contexto atual, temos várias forças contrárias a operar e é essencial avaliar cada uma delas para tentar antecipar em que ponto da balança será mais provável que nos encontremos.
Bebidas e alimentos consumidos ao almoço mantêm crescimento
O crescimento do mercado de grande consumo, vivido durante a pandemia, abrandou de 10,6% para 2,1%, após o fim generalizado das restrições, a nível mundial. No caso da Europa, o crescimento acabou mesmo por ser revertido, de 11,6% em 2020 para -0,2% em 2021. Este fenómeno era esperado, uma vez que os consumidores puderam voltar a sair e a consumir fora de casa. No entanto, a normalização do teletrabalho, mesmo que parcial, mantém o consumo de algumas categorias num nível superior ao período pré-pandémico. Isto acontece principalmente no período diurno de trabalho, o que leva a que produtos que consumimos mais nesses momentos, como as bebidas (sem álcool), o pão, o café, mas também o leite e o queijo tenham mantido, a nível global, um crescimento sustentado desde que começou a pandemia. Focalizar esforços para este momento de consumo continuará a ser essencial.
Inflação leva à diminuição do tamanho das cestas, para controlo do out-of-pocket
O primeiro efeito visível do aumento de preços é a racionalização das cestas no momento da compra. Assiste-se já a uma compra mais disciplinada, com menos decisões impulsivas, de forma a que as famílias possam controlar o valor do ticket, apesar do aumento dos preços. Torna-se assim imprescindível, para os retalhistas, otimizar o sortido proposto em cada categoria e para as marcas aumentar a sua visibilidade dentro da loja.
Haverá downtrading por parte dos compradores
Mudar o mix de produtos na cesta, de forma a torná-la mais económica, sem ter de cortar tanto na quantidade comprada, será outra forma de lidar com a inflação. As estratégias poderão passar por uma adaptação do tamanho das embalagens, a escolha de marcas próprias em vez de marcas nacionais ou segmentos mais básicos de produtos. Mas nem todos os compradores agirão da mesma forma, dependendo do país, do perfil do lar e da própria natureza das categorias. Nos casos em que a proporção do orçamento familiar dedicada à alimentação é maior, por exemplo, o comprador procurará provavelmente formatos mais pequenos. Mas em lares com uma maior elasticidade do gasto, poderá fazer sentido opções de packs económicos XXL. Da mesma forma, apesar de ser visível o aumento do peso das marcas próprias de forma generalizada, algumas categorias serão mais propícias ao mesmo e é essencial antecipar o grau de vulnerabilidade das marcas neste contexto.
O papel das promoções é ainda indeterminado
Podemos esperar que a maior procura por promoções possa ser uma forma de controlo dos gastos por parte das famílias. Mas, mais uma vez, não é certo que esta venha a ser a primeira escolha dos compradores, principalmente em mercados onde as promoções já se tornaram um fator quase higiénico desde a última crise, como em Portugal. Um shopper mais consciente e racional no momento da compra pode vir até a dar menos importância às promoções, principalmente se a sua opção preferencial for pela marca própria.
Consolidação da posição das insígnias onde predominam as marcas próprias
Os discounters ou outras insígnias internacionais onde a marca própria é predominante (como a Mercadona), já se encontravam nos últimos anos numa trajetória de consolidação da sua posição na grande maioria dos mercados, tendo ganho de forma global 0,2 pp de quota de mercado em valor desde 2019. Esta consolidação irá manter-se, até mesmo porque estas insígnias têm uma estratégia de expansão e abertura de novas lojas por toda a Europa, e pode vir a ser reforçada pelo maior apetite dos compradores pelas marcas próprias no contexto de inflação. Esta realidade obrigará as marcas a estarem ainda mais focadas em provar o seu lugar de relevância dentro destes modelos.
O papel do e-commerce num mundo em que a procura por conveniência não vai desaparecer
A nível global, o canal online foi em 2021, como em 2020, aquele que teve um maior crescimento no mercado de grande consumo. Este canal de compra cresceu em 2021 15,8% (em 2020, tinha crescido 45,9%), atingindo uma quota de mercado de 7,2%. A Ásia é quem mais contribui para este resultado sendo que, na Europa, o desempenho do canal é bastante díspar e houve, genericamente, um grande ajustamento em 2021, resultante da maioria dos países deixar de estar sob restrições. Ainda assim, o potencial continua a ser grande, uma vez que alguns países se encontram já acima da média global, como Reino Unido ou França com 13,2% e 8,8% de quota, respetivamente, enquanto a grande maioria acaba por estar entre os 2% e os 7%, como Portugal com 3,5%. É também visível que, globalmente, e mesmo em países onde houve uma abandono de compradores do canal em 2021, estes se tornaram mais fiéis ao mesmo, aumentando a sua frequência de compra. Importante será ter em conta que, com o crescimento do mercado, já não será suficiente olhar para ele como um todo, uma vez que estão a emergir, e a ganhar grande importância em mercados como a China, vários modelos dentro do canal. Dos agregadores aos players de quick commerce, que têm estratégias de entrada muito agressivas em termos de promoções, as oportunidades e/ou ameaças são várias para os retalhistas tradicionais e as marcas, e será necessário avaliar a posição relativa de cada um momento neste novo contexto.
Para explorar o relatório Winning Omninchannel 2022 vá a https://kantar.turtl.co/story/winning-omnichannel-2022-p/page/1
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