Caçadores de Mitos: Edição Combustíveis
Artigo original publicado na Hipersuper
Muito já se tem escrito sobre o aumento de preços dos combustíveis e como isso impactou o comportamento de compra dos portugueses. O sobe e desce de preços semana a semana forçou ajustes e adaptações: vamos mais vezes abastecer o carro, pagamos mais de cada vez, mas metemos menos litros do que no ano anterior. Haverá mitos que ainda não foram postos à prova?
Mito 1. Atrair os abastecimentos mais pequenos é fundamental para ter uma sólida posição no mercado
Existem mais 740 mil automobilistas a fazerem abastecimentos abaixo dos 20€ do que no ano anterior, sendo que em 2022 estes abastecimentos tiveram um peso ligeiramente superior a 2021 no valor do mercado. No entanto, quando falamos de veículos abastecidos sempre até aos 40€, estamos a referir-nos apenas a 6,4% dos veículos e a um terço do peso em valor.
Olhemos para o outro lado da balança: veículos que só fazem abastecimentos acima dos 60€ (considera-se aqui como atestar o carro). Estes são apenas 3,9% de todos os veículos, representam o mesmo em valor e têm uma média de gasto por ato de 85€ (quase o dobro do mercado).
Em 2022, os abastecimentos acima dos 60€ representaram 52% de todo o valor do mercado, e cresceram face ao ano anterior. Apesar das oscilações de preços, estes são os grandes decisores de quota. Os automobilistas vão gerindo os seus abastecimentos segundo as suas necessidades, mas num ponto ou outro do tempo, 80% dos portugueses acabou por fazer um abastecimento de mais de 60€ em 2022.
Mito 2. Portugueses passaram a abastecer mais ao fim de semana
Em Junho de 2022 a Kantar já tinha confirmado que era um mito: os portugueses sempre abasteceram mais os seus carros ao fim de semana, porque é quando têm mais tempo livre e, portanto, neste sentido, não se verificou alteração de comportamento. No entanto, na segunda metade do ano as oscilações de preço tornaram-se mais frequentes e isso levou a um pequeno ajuste, mas não ao fim de semana. Foram os abastecimentos à segunda e à sexta-feira que cresceram ligeiramente face ao ano anterior.
Os portugueses esperam pela descida de preço à segunda-feira para atestar os seus carros (com abastecimentos acima dos 60€). Aliás, o motivo de escolha para o posto de abastecimento que mais se destaca à segunda e à terça-feira, face aos outros dias da semana é mesmo o preço do combustível. O mesmo acontece à sexta-feira, quando começam algumas promoções/descontos de fim de semana.
É interessante observar que o meio da semana parece ficar perdido para a “necessidade” e a “urgência”. À quarta e à quinta-feira, o motivo de escolha do posto de abastecimento que mais se destaca face aos restantes dias é mesmo ter o veículo na reserva e o posto de abastecimento ser “perto/no caminho”. Ao mesmo tempo, é nestes dias que mais se destacam os abastecimentos abaixo de 20€.
Ao fim de semana, ter um cartão de fidelização/desconto e a confiança na marca destacam-se na escolha do posto de abastecimento. Efetivamente, existiu um pequeno ajuste na compra dos portugueses durante o fim de semana, mas só ao domingo: atesta-se menos e há mais abastecimentos até aos 40€, possivelmente na expectativa da descida de preço no dia seguinte.
Mito 3. Os cartões e descontos são determinantes para o abastecer o carro
A proliferação de parcerias, cartões e sistemas de lealdade no mercado dos combustíveis faz parecer que se tornou quase banal ter um cartão. Em média, cada veículo usa mais de dois cartões para abastecer. De todos os cartões no mercado, há um cartão parceiro do retalho alimentar que se destaca por ser usado por mais de metade dos veículos portugueses. Aliás, dos dois cartões que cada veículo utiliza, um é de uma parceria com retalho alimentar.
Mas será de facto driver de valor para as gasolineiras ter parcerias e oferecer descontos? Um dos motivos de escolha do posto de abastecimento que se destaca quando se fala em atestar o carro (abastecimento superior a 60€) é o ter um cartão de fidelização/desconto, sendo que 66% dos veículos que atestam usam desconto em algum momento. Mais, os abastecimentos feitos com desconto têm um gasto por abastecimento 14% superior aos que não têm um desconto associado. Por outro lado, as parcerias com o retalho alimentar representam já 30% do valor do mercado de combustíveis, e estas trazem, em média, um ganho ainda maior com um gasto por abastecimento 19% superior vs a média do mercado.
Então todos os cartões e parcerias geram valor? Como em tudo na vida não há soluções absolutas e perfeitas. Existem cartões de lealdade de gasolineiras com confortáveis bases de compradores que não geram valor adicional nos abastecimentos para a marca. Também há parcerias com o retalho alimentar que representam gastos médios inferiores aos abastecimentos efetuados com os cartões das próprias gasolineiras. Há que estudar o comprador de cada marca e entender o que procura, quando e quais são os benefícios que o trazem ao posto de abastecimento.
Mito 4. As marcas não geram valor, os portugueses só procuram low-cost.
O preço do combustível é o segundo motivo de escolha do posto de abastecimento mais forte do mercado e destaca-se especialmente nos abastecimentos abaixo de 40€. O principal motivo é a localização, o estar perto ou a caminho na hora de escolher um posto de abastecimento e sobressai-se nos abastecimentos abaixo de 20€.
De facto, as marcas low cost conquistaram terreno nos últimos anos e ganharam quota de mercado, mas o seu terreno forte são os abastecimentos abaixo dos 40€. Contudo, já referimos no Mito 1 que estes são os abastecimentos que menos valem no mercado.
Na hora de atestar o veículo, os automobilistas portugueses dão especial valor à qualidade dos produtos e também à confiança na marca e é nestes abastecimentos que se destacam as gasolineiras de marca com quotas que chegam a ser 30% superiores à sua média.
Assim, vemos que os grandes vencedores de 2022 são a Cepsa e a Prio. Ambas recrutam compradores e mais abastecimentos por comprador, ganhando quota no mercado de abastecimento particular. Dois posicionamentos distinto que levaram ao sucesso: construção de fidelidade via cartão e experiência, no primeiro caso e posicionamento de preço baixo, no segundo.
No polo oposto está a BP, que perde abastecimentos, cresce menos de metade do mercado e perde 3pp de quota. Também as Marcas de Distribuição deixam de ser tão atrativas para os automobilistas portugueses, não encontrando a valorização suficiente no seu posicionamento low cost para justificar a deslocação.
O mercado dos combustíveis está cada vez mais competitivo. Seja preço, qualidade, cartões de lealdade/parcerias, ou até mesmo localização, as escolhas dos compradores estão cada vez mais voláteis. Ao longo destas linhas vimos mais do que um exemplo de indicadores positivos e de valorização, que depois não se revelam incrementais para as marcas. É necessário conhecer o comprador e a concorrência para entender quão sólida é a posição de uma marca no mercado, e quais os pontos a trabalhar para conquistar valor.
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Marta Santos
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